sábado, 8 de julho de 2017

Dia 3 | Treinar o desapego

Bem cedo, às 5h30, saímos de casa para ir ao aeroporto buscar a última colega que ia chegar. De hiace pela cidade de São Tomé, passámos por alguns pontos-chave de São Tomé, como as associações, instituições e empresas onde teremos de ir em breve por causa dos nossos projectos.
A visitar o mercado, perdida no meio das frutas e legumes e peixe salgado, marisco de molho, e mais frutas, totalmente absorvida pelo ambiente da feira de rua, não associei o porquê daquele homem vir tão perto de mim, tão colado às minhas costas. Passado 30 segundos parei de absorver as frutas e fez-se luz. Claro que fiquei sem o meu telemóvel que vinha na bolsinha de fora da mala. O meu incrível e duradouro telemóvel Nokia de 5€. Tanto tempo em Portugal a decidir se comprava um telemóvel inteligente, tanto tempo a adiar, tanto tempo a ponderar usar esse novo telemóvel em STP, para comunicar com Portugal, e assim num minuto a decisão de não comprar fica bem clarificada na minha cabeça: STP não é o local para estrear assessórios. Trazer o que é velho. Talvez isso se aplique em todas as viagens. Eu, que valorizo bastante os meus pertences, tentei não ficar chateada com o sucedido. Afinal de contas, sou eu o agente externo, eu é que não pertenço aqui e não tenho o direito de ficar chateada com o facto de ter sido roubada, principalmente quando já tinha sido alertada para situações como esta, no mercado.
Porcaria das frutas coloridas distractivas.
Bem, é só um telemóvel e posso comprar outro. Vou finalmente treinar o desapego do telemóvel. O que será realmente meu? A memória do mercado? Eu que tenho tão má memória, o que é realmente meu?
Na padaria Miguel Bernardo, o meu segundo contacto com dinheiro e até estou orgulhosa de mim, pois não conseguiram aldrabar-me e pedi o troco correcto. Faltava uma nota de 500.000. Raios parta a porra desta manhã! Mas ainda assim, não fiquei chateada, pois também nos tinham alertado para o facto de aldrabarem turistas nos trocos. E este Sábado foi o “dia de folga”, então estávamos sem as t-shirts, logo tínhamos caras de turistas.
Foi o Simão que trocou os nossos euros por dobras, para não sermos enganados. Que molhão de notas!
100€ = 2.500.000 dobras = 25 notas de 100 conto = I'm rich, babe!
De volta a Neves, resolvemos ir até ao Mucumbli. O Mucumbli é um resort para turistas, e tem uma descida directa para a praia. Esta é a única praia onde podemos ir, aqui em Neves, pois é pouco frequentada pela população local. Só vi a praia lá ao longe, e regressei sozinha, para ir finalmente à Internet mandar notícias para Portugal.

No caminho sozinha, pela estrada, dois tipos de mota ofereceram-me boleia. Estive tão tentada em aceitar a primeira, só depois me lembrei que está nas regras da WACT: não podemos andar de mota. O seguro não cobre. Se eu caísse, voltava para Portugal mais cedo. Se me levassem para um beco, possivelmente nem voltava para Portugal, de todo. Então continuei a caminhada. São cerca de 20 minutos a ver bananeiras.
No Kitembú Digital, a Internet é uma treta, e não consegui falar directamente com os meus pais, que era o meu objectivo. Passei a palavra às manas, na esperança de os lembrarem para desactivar o cartão do telemóvel roubado.
As miúdas que trabalham no Kitembú, a Ju e a Márcia, totalmente descontraídas. Ali, não deve haver stress no trabalho. Eu fiquei para além da hora em que disseram que fechavam e estava tudo na boa. Eu não tinha notas pequenas para pagar a hora de Internet, e estava tudo na boa, pagava na 2ªfeira, durante a reunião na Rádio. Se calhar, e só numa ideia rápida, aprenderia muito com estas pessoas sobre desapego.
Ontem, o Muller explicava-me a poligamia que aqui se vive. As mulheres sabem que o homem delas tem outras. Às vezes, dormem numas casas, às vezes, dormem noutras. É a puta do desapego? Pelos homens, pelo menos. Incrível capacidade das são-tomenses.
Bem, as duas miúdas disseram-me que não se importavam de experimentar os briquetes, apenas têm de saber o que é, e como se faz. Será que irá ser assim tão fácil sensibilizar para a utilização de briquetes em vez de carvão?

O almoço foi cachupa de peixe, que delícia! Ando a repetir todos os pratos, creio bem que vou ficar redonda… Tal como as são-tomenses.
À tarde, fomos novamente até à praia. No bar do resort, provei a cerveja local. Vem numa garrafa de meio litro, sem qualquer rótulo e sabe mesmo a cerveja artesanal, com o sabor bem apurado da cevada. O seu nome é Rosema e creio que iremos passar muitos e bons momentos desta minha estadia em São Tomé.
Um morcego passa por entre as bananeiras do jardim do Mucumbli. Pelos vistos, os morcegos gostam destas árvores. Os miúdos na Generosa tinham fisgas feitas com paus de madeira e elásticos, que utilizam para atirar pedras contra a estrutura da bananeira, a lula. Ao que parece, os morcegos permanecem dentro da lula a alimentar-se, até levarem com uma pedra na cabeça e caírem, para eles próprios servirem de alimento… Aos miúdos.

E cheguei à praia, finalmente. Água limpa, aqui os são-tomenses não cagam na praia, pelo menos tão frequentemente. Pedra preta e areia… preta. Areia preta nos meus pés, pela primeira vez! A praia com tanta vegetação!
Lindo, fantástico.

Fiquei ainda algum tempo a contemplar tal beleza, até que fui ao banho. O banho não é nada parecido aos banhos de Portugal, a água não é tão fria. Não me aventurei mar adentro, pois a minha querida mãe alertou-me para o facto de haver tubarões ao longo da costa. E ontem, pelo que ouvi, foram avistados dois. Eu não vi nenhum! Por acaso adorava ver uma barbatana a passar. Longe, de preferência.

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